OS MORADORES DE RUA
- Tais Luso de Carvalho
Estes desprovidos de
sorte, filhos de uma vida desgraçada, passam o dia caminhando, comendo as
sobras e o podre dos outros. É dureza caminhar tanto, suplicar tanto para no
fim do dia conseguirem comer lixo. E os responsáveis por isso, por este lindo
quadro patriótico, passam sem olhar. Não interessa olhar para desgraça. Todos
querem ver uma cidade bonita, limpa, arborizada e florida; quanto mais florida,
melhor! Esconde o horror.
O que mais se vê pelas
esquinas dos países em desenvolvimento, é gente dormindo pelos cantos, enfiados
em buracos ou em caixas de papelão, num canto debaixo de qualquer coisa que se
pareça com teto. Vivem como ratos; mas são os moradores de rua: um dia aqui,
outro ali... Caminham e procuram por um canto até terem a certeza do sossego. E
contam com a sorte de não serem importunados por gente sem piedade.
E nós, os mais sortudos,
damos de cara com este mundo cão, um mundo que saltou da condição de pobreza,
para a indigência, porém, muitas vezes ainda botamos banca, achando que ver
isso é desagradável. Desagradável é pouco: é desumano tanto descaso. Mas a
solução não está em nossas mãos: o brasileiro trabalha meio ano para pagar
imposto e o que vemos é isto. De nada adianta a população sair a distribuir uns
trocados; isto nós fazemos. E não soluciona, nem minimiza o problema.
Pelas ruas, mãos humilhadas se estendem; nos
tocam e suplicam. Já conhecem o que é desprezo, o que é fome, o que é sede, o
que é martírio. Conhecem um lado da vida que nós não conhecemos. Banheiros e
chuveiros não existem para os moradores de rua. E como é que fica? Algum
político já deu alguma solução? Não: lugar de fazer as necessidades
fisiológicas fica a quilômetros, subindo os morros, na mata. E olha lá.
Então vem a pergunta que
não cala: por que esta gente não arruma um emprego? Por que ficam pedindo, ao
invés de trabalharem?
Ora... como resolver este
problema se esta gente é solitária, doente, desamparada, sem escolaridade...
Não há interesse político voltado para todos eles; não temos uma ação social
eficaz. E outras pragas mais. O dinheiro é para outros fins.
Dá pra entender que somos
um país em dificuldades; só não deu pra entender, ainda, que um país
continental como o nosso, com tanta gente miserável morando nas ruas, com
milhões de pessoas passando fome, que ainda se escute que não há verba
suficiente para matar a fome do povo e lhes proporcionar um teto.
PORÉM...
Para meu espanto, de uma
hora pra outra surgem milhões de nossas reservas para mandar pra fora do
país... Fazendo bonito com o sacrifício de nossa população indigente, que come
capim e faz sopa de papelão e jornal. Sei que é um enorme problema social, mas
seguindo meu bom senso, teríamos de resolver, primeiro, o problema da nossa
gente: dar comida e teto para o Brasil. Mas não é bem assim: existem as
negociações! E, enquanto os homi ficam trocando figurinhas, nossa gente que
espere, que continue a comer lixo.
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