- PEDRO LUSO DE CARVALHO
PABLO
NERUDA, cujo nome de registro civil era Neftalí Ricardo Reys Basoalto, nasceu a
12 de julho de 1904, em Parral, Chile. O poeta morreu na capital de seu país,
Santiago, em 23 de setembro de 1973. A sua poesia se caracteriza pela invenção
e reinvenção de temas profundamente ligados ao amor e à vida.
Neruda,
sabidamente um dos mais importantes poetas dos tempos modernos, deixou uma
extensa obra, com mais de 50 livros, que foram traduzidos para vários idiomas,
tendo uma vendagem superior a um milhão de exemplares.
O
intenso lirismo da poesia de Neruda e a sua criatividade prodigiosa, com cinco
volumes de poesia publicados quando contava com apenas 22 anos, na década de
1920, contribuiu fortemente para firmar a sua reputação. O seu segundo livro,
Vinte poemas de amor e uma canção desesperada, logo se tornou popular e um
clássico, em razão da elegância, doçura e profunda melancolia.
Quanto
ser ou não comprometida a poesia de Neruda, a resposta correta é dada por José
Miguel Ibañez Langlois, também chileno, nascido em Santiago, professor de
Literatura da Universidade do Chile: “Neruda como poeta tem o compromisso
imediato que a sensibilidade contrai ante o objeto que a estimula: o corpo da
mulher, a paisagem, o espetáculo da fome ou da miséria. Não conhecemos outro
compromisso de maior profundidade, de Neruda como poeta”.
No ano
de 1940 Neruda começou a escrever um poema épico, para o qual levou elementos
da flora, da fauna, da história, da mitologia e das lutas políticas da América
Latina. O seu livro Alturas de Machu
Picchu, inspirado nas civilizações pré-colombianas, viria tornar-se o
centro do épico Canto geral (1950).
Em 1971,
a Academia Sueca concedeu a Pablo Neruda o Prêmio
Nobel de Literatura.
Segue A casa, poema de Pablo Neruda (in Neruda,
Pablo. Antologia Poética. Tradução de
Thiago de Mello. Rio de Janeiro: 1964 p. 36-37):
[ESPAÇO DA POESIA]
A CASA
[ PABLO NERUDA ]
Minha
casa, as paredes cuja madeira fresca,
recém-cortada
ainda recende: desarrumada
casa da
fronteira, que rangia
a cada
passo, e silvava com o vento de guerra
do tempo
austral, fazendo-se elemento
da
tempestade, ave desconhecida
sob
cujas plumas frias germinou meu canto.
Vi
sombras, rostos que como plantas
cresceram
ao redor de minhas raízes, parentes
que
cantavam toadas à sombra de uma árvore
e
disparavam entre os cavalos molhados,
mulheres
escondidas na sobra
que
deixavam as torres masculinas,
galopes
que açoitavam a luz,
contaminadas
noites de
cólera, cães que ladravam.
Meu pai
com a madrugada ainda escura
da terra
para que perdidos arquipélagos
se
deslizou em seus trens que ululavam?
Mais
tarde amei o cheiro do carvão na fumaça,
as
graxas, os eixos de precisão gelada,
e o
grave trem cruzando o inverno estendido
sobre a
terra, como uma larva maravilhosa.
De
repente as portas trepidaram.
É meu
pai.
Rodeiam-no
os centuriões do caminho:
Ferroviários
embrulhados em suas capas molhadas,
o vapor
e a chuva com eles revestiram
a casa,
a sala de jantar se encheu de relatos
enrouquecidos,
os copos se esvaziaram
e até
mim, dos seres, como uma separada
barreira,
em que viviam as dores,
chegaram
as aflições, as taciturnas
cicatrizes,
os homens sem dinheiro,
e a
garra mineral da pobreza.
* * *